quarta-feira, 14 de abril de 2010

Calabresa Neles!

Giulia Gomes


“Depois do Tsunami ninguém culpou o governo da Indonésia!” – essa foi uma das pérolas que “nosso”querido prefeito Jorge Roberto Silveira disse em entrevista. Dadas as diferentes catástrofes naturais, não é certo, muito menos para o responsável, ignorar a arraigada tradição de construções irregulares em morros e a ligação disso com o tamanho do desastre. Politicagem?

As famílias mortas no Morro do Bumba pagavam impostos, luz e tinham asfalto. Sacos de tijolos como presentinhos de campanha geram mais uma laje, um puxadinho. Agrado imediato aos prováveis eleitores. Ações meramente paliativas para passar o problema junto com o mandato.

Não é certo!

Mas, o que é certo?

Esse desastre em Niterói e os dias de pânico que sucederam mostraram muitas feridas da nossa sociedade como um todo. Foi um espetáculo de “faça o que eu digo, não faça o que eu faço”. Choveram intenções, frágeis como os barrancos irregulares.

Todos conhecem alguém que perdeu tudo, geralmente os “trabalhadores” dos lugares que freqüentam. A princípio, a cidade se comoveu e todos ficaram de luto e mobilizados. Todo dia na TV, centrais de donativos lotadas. Foi uma semana de solidariedade intensa, junto com o luto oficial, bandeiras a meio mastro e minutos de silêncio respeitosos pelas vítimas. Agora que a vida voltou ao normal e os noticiários não são tão freqüentes, a mobilização ficou por conta de poucos gatos pingados conscientes de que as pessoas continuam desabrigadas e a comida não dura para sempre.

Nas redes sociais na internet o que não faltavam eram perguntas preguiçosas.
- Que horas os abrigos aceitam visitas?
- Recebem donativos no domingo? Não né??!!

Muitas vezes, a gente quer ajudar, mas não sabe como. Aí fica adiando a busca por informações até a consciência ficar tranqüila e se ocupar com outras coisas “mais urgentes”. O que eu vi de gente falando muito e fazendo nada! Sempre mostrando a intenção de ajudar, mas deixando para amanhã.

- Você é voluntária??
- Sou!
- Maneiríssimo!
- Por que você também não é?
- Estou muuuuito ocupado!

Eu tive a felicidade de conseguir quebrar essas barreiras do adiamento e meter a cara. Primeiro fui num colégio público no Cubango que estava abrigando cerca de 200 pessoas, 50 delas eram crianças. Não fazia idéia do que fazer! Cheguei na hora do almoço! Um vizinho meu me apresentou a uma garotinha de uns 4 anos. Ele fez uma brincadeira com ela, ela sorriu e pulou no meu colo. Parei de pensar. Quando vi estava dando comida, ajudando a escovar os dentes, reunindo as crianças para pintar e brincar. Cada sorriso mais lindo que o outro! Uns mais arredios, outros extremamente dados! Me apaixonei.



Apesar de bater uma raivinha das pessoas que falam e não fazem, me lembro que fui uma delas há pouquíssimos dias. E o rancor dá lugar a pena! Pena por essas pessoas não poderem usufruir da felicidade que agora faz parte da minha vida.

Atitudes pequenas, como correr atrás de caixas de papelão e montá-las para cestas básicas. Ou sentar no chão e separar roupas doadas por gênero e idade para facilitar a distribuição. Arrumar transporte para que os donativos cheguem ao destino. Coisas pequenas! Coisas enormes!




Continuem doando! As pessoas não deixaram de precisar porque você voltou a ficar ocupado demais.
E deixo por aqui os seguintes questionamentos: Onde mais de 10 mil pessoas desabrigadas vão encontrar casas para alugar por um “vale aluguel” de 400 reais?
Como impedir que as pessoas retornem às suas casas condenadas já que não tem para onde ir? Como evitar a revolta dessa massa de trabalhadores sem assistência e esperança?

Aguardamos os próximos comunicados do Senhor Jorge Roberto Silveira...
Ou o próximo Tsunami.

5 comentários:

Sra.Thuc´s disse...

É sempre assim,um empurra com a barriga pro outro e torcem para que nada aconteça. Quanto aos colaboradores,acredite muitos acham que já cumpriram sua missão entregando umas roupinhas e tal. Esse é o mundo que vivemos,a responsabilidade não é de ninguém e a caridade é do tamanho do tempo da maioria que doa algo,quase zero.

Alexandre Vasconcellos disse...

Belíssimo depoimento, Giulia!

Nunca é tarde para sair da passividade. O mundo se muda neste tipo de pequena atitude, e não esperando que ela venha lá de cima (tanto de divindades quanto de políticos).

Por sinal, o papel dos prefeitos do RJ e Nikiti nesta tragédia foi simplesmente lamentável.

Mas sabe qual é o pior? Nós os colocamos lá, e nós o colocaremos lá na frente. Muitas vezes, em troca dos mesmos sacos de areia que vc citou.

Parabéns pelo banho de consciência!

http://amvasconcellos.blogspot.com

Lívia Pinho disse...

mais fácil um tsunami do que o Jorge Roberto falar ou fazer algo de útil.

não sei se meu questionamento é idiota ou cabível, mas será que não cabe à mídia continuar a campanha massacrante por doações que rolou na semana passada, ainda que em menor escala? e quando digo doações, não me refiro somente àquelas materiais, mas de todo tipo.

May Guimarães disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
May Guimarães disse...

É "incrivelmente...ente, incrivel", isso é dizer que o descaso é um fenômeno da natureza!!! Bom, pelo menos para o nosso honoravél prefeito é! E para as pessoas que o rodeiam tbm...hj eu li que os "pobres" Conselheiros renunciaram aos seus salários de nada mais, nda menos q seis mil reais, em prol dos desabrigados. Nossa quanta caridade...já que esses senhores trabalham tanto em um único dia da semana...isso só trabalham 1 dia na semana e ganham toda essa grana,dinheirinho suado esse. São só 23 Conselheiros,o orçamento do município destina, R$ 2,2 milhões a eles, mais que o dobro do previsto nos quatro programas voltados para recuperação, limpeza e reflorestamento de encostas (R$ 966.140). Agora é contar com a solidariedade dessas pessoas de coração tão bom...de repente eles "aconselhem" as pessoas q estão ao redor deles a fazerem o mesmo!